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PODEM OCORRER DECISÕES PARCIAIS DO MÉRITO DAS CAUSAS? SE ASSIM O FOR, TEREMOS QUE FAZER MAIS DE UM DEPÓSITO RECURSAL? – Por Ana Beatriz R. Oliveira (sócia CN)

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PODEM OCORRER DECISÕES PARCIAIS DO MÉRITO DAS CAUSAS? SE ASSIM O FOR, TEREMOS QUE FAZER MAIS DE UM DEPÓSITO RECURSAL? – Por Ana Beatriz R. Oliveira (sócia CN)

Para melhor entendermos a questão:

 

1) O que é o julgamento antecipado parcial de mérito?

O julgamento antecipado parcial de mérito é uma medida que, em tese, contribui para a efetividade jurisdicional, permitindo a solução, ainda que parcial, do conflito existente.

No campo do Processo Civil, a matéria foi consagrada no art. 356 do CPC:

Art. 356. O juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles:

I – mostrar-se incontroverso;

II – estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355 .

  • A decisão que julgar parcialmente o mérito poderá reconhecer a existência de obrigação líquida ou ilíquida.
  • A parte poderá liquidar ou executar, desde logo, a obrigação reconhecida na decisão que julgar parcialmente o mérito, independentemente de caução, ainda que haja recurso contra essa interposto.
  • Na hipótese do § 2º, se houver trânsito em julgado da decisão, a execução será definitiva.
  • A liquidação e o cumprimento da decisão que julgar parcialmente o mérito poderão ser processados em autos suplementares, a requerimento da parte ou a critério do juiz.
  • A decisão proferida com base neste artigo é impugnável por agravo de instrumento.

 

De acordo com o mencionado artigo 356 do CPC, ao juiz é possível decidir parcialmente o mérito de forma antecipada quando:

(i) um ou mais dos pedidos formulados se tratar de matéria eminentemente de direito; ou

(ii) fundarem-se em fatos incontroversos; ou ainda,

(iii) estiverem satisfeitas as provas necessárias para elucidação do mérito do pedido.

Quanto aos demais pedidos, continua-se o rito procedimental normal, que passam para a fase instrutória.

O fundamento para esta previsão se coloca nos princípios da razoável duração do processo e da eficiência, previstos na Constituição Federal no artigo 5º, LXXVIII e, como princípio da Administração Pública, no artigo 37, caput, respectivamente.

O objetivo da lei, por meio da introdução da figura do julgamento antecipado parcial do mérito foi diminuir a morosidade processual, atendendo, assim, ao princípio da razoável duração do processo.

A intenção, de fato, diante de uma cumulação de pedidos, havendo a possibilidade de julgamento antecipado de um ou alguns dos pleitos, atendendo à celeridade processual, é permitir a execução de eventual parcela deferida, tornando efetiva a prestação jurisdicional.

Isso porque, pode parecer injusto, quando existe um pedido incontroverso ou pretensão em relação à qual não são necessárias mais provas, impor à parte autora aguardar toda a dilação probatória para que todos os pleitos sejam julgados em conjunto.

 

2) É aplicável no Processo do Trabalho?

Conforme a previsão do art. 5º, da Instrução Normativa 39/2016, do TST, referido artigo é aplicável às causas trabalhistas, senão vejamos:

Art. 5° Aplicam-se ao Processo do Trabalho as normas do art. 356, §§ 1º a 4º, do CPC que regem o julgamento antecipado parcial do mérito, cabendo recurso ordinário de imediato da sentença.”

 

Contudo, embora o CPC de 2015, no art. 356, autorizasse o julgamento antecipado parcial do mérito e o TST na IN 39, no art. 5º, permitisse sua aplicação no processo do trabalho, na prática, ele não era utilizado em razão da inexistência de fluxo procedimental do PJE.

Agora, o Tribunal Superior do Trabalho editou ato conjunto, no dia 10.08.20, para regulamentar o processamento dos casos, no primeiro grau de jurisdição, de decisão parcial de mérito.

No ato conjunto há a criação da classe 12760 – Recurso de Julgamento Parcial, como também a previsão de outras classes processuais, como recurso ordinário, agravo de instrumento, dentre outros.

 

3) Na prática, como pode se dar o julgamento antecipado parcial do mérito?

 

Na prática, o julgamento antecipado parcial pode se dar, como verdadeira decisão de saneamento do processo (que inexiste obrigatoriedade no Processo do Trabalho), quando, por exemplo:

 

(a) o Juiz verificar estar configurada a prescrição da pretensão ou a decadência do direito da parte autora (o que pode ser feito inclusive de ofício).

Normalmente, a aferição da ocorrência de tais fenômenos (prescrição – decadência) independe de provas. Mas, ainda que raro, pode ser necessária investigação probatória para determinar-se, por exemplo, quando efetivamente se deu o termo inicial do prazo prescricional ou decadencial (Por ex. doença profissional ou acidente de trabalho, com data da ciência inequívoca da perda de capacidade laborativa). Nesse caso, obviamente, não caberá a aplicação do julgamento antecipado do mérito.

 

(b) apresentar-se ao Juiz ato de disposição de vontade destinado a compor a lide (reconhecimento do pedido, por parte da Reclamada; renúncia à pretensão pela parte autora; ou transação).

Tais atos de disposição de vontade e sua consequente homologação judicial podem ocorrer a todo tempo no curso do processo.

 

(c) para a solução do mérito da causa, não houver a necessidade de produção de outras provas.

Ou seja, os elementos probatórios constantes dos autos já são suficientes para o juiz formar sua convicção sobre os fatos da lide e resolvê-la, como no caso de os aspectos fáticos serem incontroversos – resumindo-se a discussão entre as partes às decorrências jurídicas de tais fatos; ou a prova documental já trazida aos autos ser suficiente para o julgamento do mérito.

 

(d) ocorrer a revelia e seu efeito principal de presunção de veracidade dos fatos narrados pela outra parte.

 

Para melhor exemplificar: em uma determinada ação trabalhista, a parte autora pretende pagamento de verbas rescisórias e de horas extras. Em contestação, a Reclamada controverte o pleito de pagamento de horas extras, mas reconhece que não pagou as verbas rescisórias (em decorrência da crise ante a pandemia do covid19). É possível, então, o Juízo de primeiro grau, antes mesmo de instruir o processo quanto ao pleito de horas extras, já julgar antecipadamente o mérito do pleito relativo ao pagamento das verbas rescisórias.

Assim, o fatiamento do mérito pode ocorrer em relação a um ou alguns dos vários pedidos formulados na ação, na reconvenção ou em outras demandas incidentais (como é o caso da denunciação da lide). Outro exemplo: o autor formula três pedidos na inicial – e dois deles, por ocasião do julgamento conforme o estado do processo, não apresentam nenhuma controvérsia quanto aos fatos que os embasam, havendo necessidade de provas apenas relativamente ao terceiro pedido. Exemplificando, ainda: as provas documentais reunidas nos autos já são suficientes para elucidar os fatos relevantes para o julgamento do pedido feito pelo autor, sendo necessária somente instrução probatória relativamente ao suporte fático da reconvenção que o réu formulou.

Mas, o fatiamento pode ainda incidir sobre uma única pretensão formulada, na medida em que ela seja fracionável, decomponível. Por exemplo: o Reclamante pede a condenação da Reclamada ao pagamento de diferenças de verbas rescisórias no valor de cinco mil reais, e a Reclamada desde logo reconhece a procedência de parte delas, no valor de quinhentos reais, defendendo-se quanto ao resto.

 

4) No caso do julgamento antecipado parcial do mérito, qual o procedimento que a ser observado?

O ato conjunto editado pelo TST no dia 10/8/20, vem regulamentar o processamento dos casos, no primeiro grau de jurisdição, da decisão parcial de mérito. Em suma:

Permite que o Juiz resolva de maneira definitiva a parte do conflito quando presentes os requisitos necessários. Assim, havendo a existência de um pedido ou parcela dele que se mostre incontroverso, de modo que não necessite mais da fase de instrução, ou seja, que estiver em condições de um imediato julgamento, este já poderá ser decidido de forma parcial.

Deve ser salientado que as demais partes do pleito, ainda sem a necessária cognição para julgamento, deverão seguir para a fase instrutória e, posteriormente para a fase decisória.

Diante disso, ressalta-se que a decisão parcial quanto ao pedido julgado, terá a natureza definitiva no processo, e dessa, operar-se-á coisa julgada material. Caso não haja a apresentação de RO, portanto, haverá o trânsito em julgado do pedido julgado antecipadamente.

Caberá a interposição de recurso ordinário da decisão que julgar parcialmente o mérito, nos autos principais, aplicando-se as regras relativas ao depósito recursal e ao pagamento das custas processuais, com a possibilidade de apresentação de contrarrazões pela parte contrária.

Caberá o agravo de instrumento contra decisão que denega seguimento ao recurso ordinário, sendo que tanto o agravo, quanto sua contraminuta, serão recebidos nos autos do processo principal.

Só após proferido o despacho de admissibilidade do recurso, é que a Secretaria da Vara do Trabalho procederá a nova classificação em autos suplementares (RO ou AI, conforme o teor do despacho).

Ressalte-se que nesse caso o RO terá efeito meramente devolutivo, não suspensivo, com procedimento normal do restante dos pedidos nos autos principais.

Em caso de reforma ou anulação da decisão parcial, com a determinação de novo julgamento, a nova decisão será proferida nos autos suplementares, no prazo de 10 (dez) dias.

No caso de anulação ou reforma da decisão parcial de mérito cujo processo principal já se encontre apto a julgamento, o juiz deverá extinguir o processo suplementar e determinar o traslado das peças inéditas para os autos do processo principal, para julgamento único.

Interposto recurso à decisão parcial de mérito, a parte poderá promover a execução provisória. Não havendo recurso da decisão que julgou parcialmente o mérito, a execução será definitiva e poderá ser promovida em autos suplementares.

 

5) O juiz pode reconsiderar essa decisão depois?

A resposta é pura e simples: não.

O julgamento antecipado parcial consiste em decisão definitiva, fundada em cognição exauriente e conclusiva quanto a uma parcela do mérito, que não pode ser revogada ou reconsiderada pelo juiz que proferir a sentença. Assim, mesmo que se verifique posteriormente, por exemplo, a falta de uma condição da ação ou de um pressuposto processual ou de qualquer outra matéria de ordem pública relativamente à decisão de julgamento antecipado parcial do mérito, não poderá o juiz revogar tal provimento.

Portanto, para atacar tal decisão, deverá a parte interessada valer-se dos Recurso Ordinário ou, caso o provimento já tenha transitado em julgado, lançar mão da ação rescisória, desde que demonstrada alguma das suas hipóteses (art. 966 do CPC).

 

6) Problemas à vista – Crítica

A maior desvantagem do julgamento antecipado parcial do mérito é que, em muitos casos, na ânsia pela rápida resolução do litígio, com a prolação de uma decisão parcial de mérito, o tumulto processual ocasionado pode acarretar prejuízo aos sujeitos do processo, sobretudo à parte vencedora, com a morosidade na prestação jurisdicional, não apenas na fase cognitiva, mas também na fase executiva.

Com o ato conjunto editado pelo TST, dificilmente haverá apenas uma sentença no processo trabalhista, de modo que devem coexistir diversas decisões judiciais sujeitas, simultaneamente, a inúmeros recursos, possibilitando execuções provisórias e/ou definitivas dos créditos trabalhistas.

Consequentemente, se é possível a existência de várias sentenças parciais de mérito, passa a ser possível também a exigência do prévio pagamento, com a comprovação de custas processuais e depósito recursal para cada uma das condenações que forem impostas pelo juiz do trabalho. E isso, frise-se, dentro de um único processo trabalhista.

Teremos que redobrar a atenção nos processos, pois o custo pode ficar alto diante da necessidade de recolhimento de sucessivos depósitos recursais!

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